O Parcelamento do Solo no Brasil: Aspectos Jurídicos e Práticos no Desenvolvimento Imobiliário


Resumo
O parcelamento do solo é um instrumento fundamental para o ordenamento territorial urbano e rural, regulado por normas que garantem a viabilidade jurídica e urbanística dos empreendimentos imobiliários. No Brasil, a Lei nº 6.766/1979 disciplina o tema, estabelecendo requisitos para loteamentos e desmembramentos, ao passo que o Estatuto da Terra e a legislação agrária impõem regras específicas para o parcelamento rural. Este artigo tem como objetivo analisar, sob uma perspectiva científica e jurídica, os aspectos normativos, doutrinários e jurisprudenciais do parcelamento do solo, bem como os desafios práticos enfrentados por incorporadoras e investidores no desenvolvimento de novos projetos imobiliários.
Palavras-chave: Parcelamento do solo, Direito Imobiliário, Loteamento, Desenvolvimento Urbano, Incorporação Imobiliária.
1. Introdução
O parcelamento do solo é um elemento central no planejamento urbano e na incorporação imobiliária, sendo um instrumento jurídico que permite a conversão de glebas em unidades imobiliárias economicamente viáveis e juridicamente seguras. No Brasil, a Lei nº 6.766/1979 regulamenta a divisão de terrenos para fins urbanos, enquanto o parcelamento do solo rural segue regras distintas, estabelecidas pelo Estatuto da Terra (Lei nº 4.504/1964) e pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA).
O crescimento acelerado dos centros urbanos impõe desafios para o planejamento territorial, exigindo um equilíbrio entre desenvolvimento econômico e sustentabilidade. A legislação brasileira busca garantir que novos empreendimentos possuam infraestrutura adequada, respeitando os princípios do Direito Urbanístico e do Direito Imobiliário. Este artigo examina, sob um viés técnico-científico e prático, a normatização do parcelamento do solo e seus impactos no setor imobiliário.
2. Conceito e Tipos de Parcelamento do Solo
A Lei nº 6.766/1979 define duas formas principais de parcelamento do solo urbano:
Loteamento: subdivisão de gleba com abertura de novas vias e criação de espaços públicos, exigindo maior planejamento urbanístico e infraestrutura (BRASIL, 1979).
Desmembramento: divisão de uma gleba sem necessidade de novas vias, aproveitando o sistema viário já existente (BRASIL, 1979 ).
No âmbito rural, o parcelamento deve respeitar as regras do Estatuto da Terra e da Lei do Cadastro Rural (Lei nº 5.868/1972), que impõem restrições à fragmentação das propriedades, visando à manutenção da produtividade agrícola (BRASIL, 1964; BRASIL, 1972).
A distinção entre loteamento e desmembramento é crucial para o desenvolvimento imobiliário, pois impacta diretamente nos custos e prazos de aprovação dos projetos, além de determinar as obrigações do empreendedor perante o município.
3. Marco Regulatório e Restrições Urbanísticas
O parcelamento do solo está submetido a um arcabouço normativo extenso, que inclui:
Lei nº 6.766/1979, que regula o parcelamento urbano e estabelece requisitos mínimos para infraestrutura (BRASIL, 1979).
Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001), que impõe diretrizes para o planejamento territorial e a função social da propriedade (BRASIL, 2001).
Normas municipais, especialmente os Planos Diretores, que definem zonas urbanas e regras específicas para o parcelamento (BRASIL, 2001).
Além disso, há restrições geográficas e ambientais impostas pelo artigo 3º da Lei nº 6.766/1979, que proíbe parcelamentos em áreas alagadiças, de declive acentuado ou com risco de deslizamento (BRASIL, 1979). No entanto, tais restrições podem ser flexibilizadas mediante estudos de impacto ambiental e aprovação dos órgãos competentes.
4. Regularização Fundiária e os Desafios da Incorporação Imobiliária
A Lei nº 13.465/2017 trouxe avanços significativos para a regularização de núcleos urbanos informais, instituindo a Regularização Fundiária Urbana (Reurb), que se divide em:
Reurb-S (social): aplicável a populações de baixa renda, com menor exigência de infraestrutura (BRASIL, 2017).
Reurb-E (específica): voltada para empreendimentos sem perfil de vulnerabilidade social, exigindo o cumprimento integral das normas urbanísticas (BRASIL, 2017).
Para incorporadoras e investidores, a regularização fundiária representa um desafio e uma oportunidade. Enquanto a burocracia e os custos da legalização são entraves, a possibilidade de valorizar terrenos irregulares por meio da Reurb tem atraído o interesse do mercado (FARIAS, 2020).
5. Responsabilidade dos Empreendedores e do Poder Público
A Lei nº 6.766/1979 atribui ao loteador a responsabilidade pela implementação da infraestrutura básica do empreendimento, enquanto o município deve fiscalizar o cumprimento das obrigações (BRASIL, 1979). O descumprimento das normas pode resultar em:
- Multas e embargos administrativos (BRASIL, 1979).
- Ações civis públicas propostas pelo Ministério Público (BRASIL, 1985).
- Criminalização do loteamento irregular, conforme previsto nos artigos 50 a 52 da Lei nº 6.766/1979 (BRASIL, 1979).
A relação entre incorporadores e poder público deve ser pautada pela transparência e pelo cumprimento das normas urbanísticas, evitando litígios e garantindo a viabilidade jurídica dos empreendimentos (MEIRELLES, 2021).
6. Jurisprudência e Segurança Jurídica no Parcelamento do Solo
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem reforçado a aplicação rigorosa da legislação sobre parcelamento do solo. Em decisão relevante, o tribunal declarou que a venda de lotes sem registro e sem a devida aprovação municipal configura crime e pode levar à nulidade dos contratos (STJ, 2018).
Caso emblemático:
STJ – REsp 1.112.182/SP: decidiu que os loteadores têm obrigação de garantir infraestrutura mínima antes da comercialização dos lotes, sob pena de nulidade dos negócios jurídicos (STJ, 2018).
Tais precedentes reforçam a necessidade de conformidade com a legislação para evitar riscos jurídicos nos empreendimentos imobiliários.
7. Conclusão
O parcelamento do solo é um instrumento essencial para o desenvolvimento urbano sustentável e para a incorporação imobiliária. A legislação brasileira impõe uma série de exigências para garantir que os empreendimentos sejam viáveis e seguros, evitando impactos negativos ao meio ambiente e à infraestrutura urbana.
Para os investidores e incorporadores, a conformidade com as normas urbanísticas e ambientais é um fator decisivo para o sucesso dos empreendimentos, garantindo segurança jurídica e valorização imobiliária. A atuação eficiente do poder público, aliada ao planejamento estratégico do setor privado, é fundamental para promover um crescimento urbano equilibrado e sustentável.
Referências
BRASIL. Lei nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979. Dispõe sobre o parcelamento do solo urbano e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 20 dez. 1979.
BRASIL. Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001. Estatuto da Cidade. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 11 jul. 2001.
BRASIL. Lei nº 13.465, de 11 de julho de 2017. Dispõe sobre a regularização fundiária rural e urbana. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 12 jul. 2017.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (STJ). Recurso Especial nº 1.112.182/SP. Relator: Min. João Otávio de Noronha. Brasília, DF, 2018.
FARIAS, M. Regularização Fundiária no Brasil. São Paulo: Editora Juspodivm, 2020.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Urbanístico Brasileiro. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2021.
