Trabalhei por muito tempo em empresas transnacionais (ou multinacionais) e tive muito contato com profissionais estrangeiros, geralmente oriundos dos países sedes das empresas. Não foram raras às vezes em que surgia um desses profissionais que questionava sobre o funcionamento do sistema tributário brasileiro. Então, como se diz no popular, “o bicho pegava”, porque por mais que se chamasse algum especialista no assunto, invariavelmente o questionante, ainda ficava com dúvidas. E pelo que tudo indica, em breve essas dúvidas poderão ser sanadas, não somente por parte de nossos amigos do exterior, mas também por boa parte dos brasileiros.
Recentemente, a câmara dos deputados aprovou em dois turnos a proposta de reforma tributária (PEC 45/19), que tem como um dos principais objetivos simplificar os impostos sobre o consumo, incentivar o desenvolvimento econômico com suporte e segurança jurídica ao setor produtivo e propiciar um sistema tributário mais justo.
De início, já se tem um ganho fantástico, pois simplificando as regras é possível ter mais transparência e todos podem saber exatamente o valor dos tributos que estão desembolsando. Segundo a própria câmara dos deputados, a proposta simplifica o sistema tributário, substituindo cinco tributos PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS por apenas um o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). Além da simplificação, um sistema tributário transparente estimula o ambiente de negócios. Conforme relatório do Banco Mundial (Doing Business 2019), uma empresa brasileira leva em torno de 1.958 horas para pagar tributos. O segundo colocado, Bolívia, leva 1.025 horas. E a média de 190 países pesquisados é de 206 horas. Portanto, espera-se que a reforma tributária venha a facilitar a vida dos empreendedores brasileiros e da população de uma forma geral.
Mas e a logística, onde entra nessa história? Com base em um estudo da Ilos "Panorama do Transporte de Cargas no Brasil", o custo logístico chega a 13,7% do PIB. Com uma logística altamente dependente do modal rodoviário, o setor fica suscetível às variações dos tributos incidentes, principalmente os relativos aos combustíveis. Reduzir o custo logístico é prioritário para o desenvolvimento econômico do país, e a reforma tributária pode, se bem conduzida, ajudar nesse processo. De acordo com a Associação Brasileira de Logística (ABRALOG), a carga tributária brasileira, de 33,3% do PIB, é uma das mais elevadas do mundo e a mais alta entre os países em desenvolvimento, que em média, têm carga de 26% do PIB. Alessandro Dessimoni, vice-presidente jurídico da ABRALOG enfatiza que a atual reforma tributária em discussão precisa oferecer a segurança jurídica de que não haverá aumento da carga tributária.
De fato, não será nada conveniente para o setor logístico ter um sistema simplificado para a aplicação de tributos, o que é muito importante, mas com uma carga alta. Nesse sentido, representantes de classe e confederações, como a CNT (Confederação Nacional do Transporte), têm se reunido com o legislativo para discutir pontos de preocupação do setor de transporte em relação à reforma tributária, entre eles a importância do creditamento do combustível e a necessidade de alíquotas diferenciadas para os modais de transporte. Além dos tributos acima mencionados, a logística também é impactada pelo IPVA (Imposto sobre Propriedades de Veículos Automotores), de competência dos estados, o que influencia diretamente nos custos de transportes e pelo IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano), de competência dos municípios, que interfere na aquisição e/ou locação de galpões logísticos.
É evidente que numa reforma dessa magnitude, haja conflitos e interesses dos mais variados setores. No que tange a logística, ainda que se considere os avanços conquistados, nos últimos anos, ela ainda é muitas vezes vista como um empecilho para o crescimento econômico do Brasil. Aliviar a carga tributária por meio de um sistema simplificado é importante. Porém, muito além disso, essa reforma tem que estimular o investimento no setor logístico, para que ele se torne efetivamente multimodal. Quem sabe, não seja uma grande oportunidade de o gigante adormecido acordar!
(*) Roberto Pansonato é Mestre em Educação e Novas Tecnologias, graduado em Design de Produto, com atuação em Gestão de Engenharia de Processos e Produção. É professor do Centro Universitário Internacional – Uninter, onde atua na tutoria dos cursos de Logística e Gestão do E-Commerce e Sistemas Logísticos.
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